Pode parecer inútil colocar uma entrevista feita a um ano atrás com um árbitro que mal conhecemos, porém, gostaria de mostrar o quão é precária a vida da arbitragem aqui no Brasil, onde eles não são profissionais (fazem outros serviços), entretanto, são cobrados como qual.
No meu ponto de vista, essa deveria ser uma profissão como qualquer outra, com formação superior (a pessoa tem que ficar estudando para isso) e não apenas achar que "apitar" seja a coisa mais simples do mundo. Futebol é paixão e se não houver alguém preparado para dirigir um jogo onde essas emoções estão à flor da pele, pode causar esta revolta, que o próprio Adriano Alves de Oliveira falou na entrevista.
Aliás, Adriano será o árbitro da partida de amanhã do Verdão contra a Patrocinense.
Enfim, este será um passo importante para que o futebol brasileiro possa ressurgir das cinzas e voltar a ser o "País do Futebol".
*Entrevista retirada do site www.corneteiro.com.br
O Corneteiro.com.br cobriu de forma exclusiva o evento de premiação da 50ª Copa Itatiaia Brahma nesta última segunda-feira (17). Numa ocasião única, tive a oportunidade de falar com Adriano Alves de Oliveira, 39 anos, considerado o melhor árbitro da competição. Muito tranquilo e muito sereno, ele comenta sobre a vida da arbitragem e das dificuldades, daquele que talvez seja a figura mais polêmica desde o surgimento do futebol – o Juiz.
Corneteiro: Brasil, o país do futebol. Toda criança já nasce com uma bola nos pés, o sonho é ser jogador. E você, como virou arbitro?
Adriano: Olha, pra ser sincero, eu comecei jogando futebol. Quando eu percebi que não dava, e como eu sou um amante do esporte, resolvi largar o futebol amador como jogador,e fui fazer o curso de arbitragem. Tive muito incentivo, principalmente do presidente da liga de Santa Luzia, dos amigos. Aqui na Federacão eu fui muito bem acolhido. Sr. José Eugênio, me recebeu muito bem e atualmente o fundamental apoio do Dr. Paulo Schetino.
Corneteiro: …você queria trabalhar com futebol de qualquer jeito, não interessava como né?
Adriano: Perfeitamente, eu vi que não tinha habilidade, então era melhor deixar quem tinha assumir o cargo e vamos trabalhar futebol de outra forma, mas tô muito feliz com a minha escolha.
Corneteiro: E isso tudo começou quando?
Adriano: Eu iniciei meus trabalhos na arbitragem, na liga de Santa Luzia em 2007. Já em 2008 eu fui convidado para fazer parte do quadro de arbitragem da FMF.
Corneteiro: Como se dá o início do trabalho de arbitragem e quem quiser se tornar um arbitro o que deve fazer?
Adriano: Primeiramente ter gosto. As pessoas esquecem que o árbitro é uma pessoa que gosta de futebol. Mas a quem interessar, deve procurar o Eustáquio ou Adriano, do departamento técnico, aqui na FMF. Todos os requisitos são passados aos candidatos, como: ter segundo grau completo, preparo físico etc. Quem almeja ser um Arbitro CBF ou FIFA, precisa ter nível superior, além de outra exigência que é não ter mais de 30 anos.
Corneteiro: Adriano, de uns tempos pra cá tem se notado que as equipes da Região Metropolitana estão se destacando sobre as equipes da capital. Você, como juiz, acaba conhecendo intimamente os times dentro de campo. Qual a grande diferença entre as equipes de fora e as da capital?
Adriano: Sim, os times do interior tem uma outra forma de montar seus elencos e de conduzir. O investimento no interior é maior do que na capital. Eu seria injusto se falasse que os times da capital perdem ou acabam não chegando porque não são organizados. A gente vê o esforço do pessoal, das diretorias. Mas esforço somente não adianta e os times do interior tem mais recurso. Os times no interior jogam na grama, tem preparador físico, fazem treinos.
Corneteiro: Uma questão que é muito polêmica, tanto no futebol amador quanto no profissional, é a violência. Queria que você comentasse um pouco sobre esse assunto.
Adriano: Sinceramente? Ainda está complicado. Se eu falar que não melhorou eu vou estar faltando com a verdade, mudou. Melhorou. Mas, ainda falta resolver muita coisa. E quem acaba complicando as coisas são so próprios dirigentes que não providenciam policiamento, que fazem pressão pra gente iniciar a partida sem segurança. Existe uma cobrança muito grande sobre a gente.
Outro ponto complicado é que muitas vezes os treinadores, diretoria, extrapolam, perdem a cabeça. Uma palavra mal interpretada lá fora leva o atleta a fazer bobagem la dentro. Aí a gente além de arbitro, tem que ser psicologo também. Conduzir 22 pessoas, cada uma com uma índole, cada uma com uma personalidade, não é fácil. Sem contar as que estão fora de campo. As vezes falta equilíbrio da comissão em conduzir suas equipes. Gente! Futebol é uma das coisas mais bonitas que tem. Poxa, vamo fazer as coisas, vamo conduzir com um pouquinho mais de responsabilidade!
Corneteiro: Você falou de dirigente, diretoria e esportistas. E a torcida não entra nisso? Não preocupa você?
Adriano: Sem dúvida. As pessoas precisam entender que futebol é movido pela paixão. O torcedor é movido pela paixão. A responsabilidade das coisas está muito mais com as pessoas que estão lá dentro do que propriamente lá fora. Policiamento já resolve boa parte dos exageros ocorridos lá fora.
Corneteiro: E já se viu em alguma situação de aperto pelos campos de várzea?
Adriano: Meu amigo! já. A gente que está nesse trabalho passa aperto as vezes, mas graças a Deus ele tem olhado muito por nós e nada de grave ocorreu. Particularmente tivemos uma partica muito díficil de conduzir o ano passado pela divisão Especial (Serie A) do amador. Ferroviária x São Luiz no campo do Mineirinho. Placar eslástico, 6 a 1 pra Ferroviária, torcida pondo muita pressão, situação feia demais. Aí entrou o que eu falei anteriormente: policiamento. Quando os homens da PM aparecem, inibe a violência.
Corneteiro: Adriano, e com relação à condução da partida. Tem diferença muito grande do profissional pro amador? (digo, com relação as catimbas, à levada do jogo)
Adriano: Na categoria profissional os atletas já vem preparado para muitas situações. Muitas vezes o jogador profissional testa o árbitro, principalmente em início de carreira. Ele faz falta e olha pra cara do árbitro pra ver qual é a sua reação. Lá dentro ocorrem coisas que as câmeras não veem, mas que só quem tá la dentro sabe. As vezes no início da partida o jogador já testa a gente pra saber se ele pode descer mais o pé ou ficar comedido. Há casos em que muitos colegas já são mais rígidos logo no começo pra poder ter o controle da partida. Mas cada caso é um caso. Tecnicamente chamamos isso de “fazer a leitura do jogo”.
É recomendado que o árbitro se concentre antes da partida, estude os dois adversários. Conheça os jogadores, veja o tape das partidas. Há casos em que, partidas muito longe da residência do árbitro, ele se hospede um dia antes, no local onde será realizada a partida.
Já no amador a gente não tem como prever o que vai encontrar. Mas de um modo geral os jogadores, tanto profissional quanto amador, tem a mesma “manha”.
Corneteiro: Ainda fazendo o comparativo, na várzea há campos precários, desformes, inclinados, enfim… Induzindo muitos craques ao erro. Goleiros acabam falhando diante do morrinho artilheiro, ou o chute do atacante acaba no meio da lama… E para a arbitragem, no que essas condições podem prejudicar o trabalho de vocês?
Adriano: Verdade, atrapalha. As vezes você está acompanhando uma jogada, aí, um objeto no campo, um desnível acentuado, acaba tirando sua atenção e o lance passou. Quem tá do lado de fora não vê isso.
Corneteiro: Aí vão cornetar o árbitro que não marcou o lance ou o artilheiro que perdeu o gol…
Adriano: Futebol é paixão, eu sei disso. Muitas vezes o atacante vai lá perde 10 gols na cara. O time toma um contra-ataque, a defesa vai lá comete uma penalidade. Qual a nossa função? Marcar. Mas o que a torcida vai falar? Que foi injusto. Que o juiz alterou o resultado da partida. Passam a esquecer o atacante que perdeu um monte de gols.
Corneteiro: Falando em erro de arbitragem, você deve ter acompanhando as constantes pressões sobre a Fifa para alterar as formas de arbitragem, com auxílio eletrônico, utilização de banderinhas nas linhas de fundo etc. Você é à favor disso?
Adriano: Eu acredito que tudo que venha para melhorar o futebol, é benvindo. Tudo que for feito para deixar o futebol um espetáculo cada vez mais apaixonante é benvindo.
Corneteiro: O futebol em sua estrutura atual é toda formada por profissionais, técnicos, médicos, jogadores, diretores, times que viram empresas etc. E o juiz ainda é aquele cidadão que durante a semana é bancário, enfermeiro, professor de educação física e que, no domingo tá lá prestando um serviço ao futebol. Você acha que tem que profissionalizar os juízes também?
Adriano: Na minha opinião é uma injustiça. Toda estrutura é profissional e ganha como tal. Nós não somos vistos como profissionais, mas somos cobrados como profissionais. Alguma coisa está errada. Poxa, eu sou funcionário do hospital das clínicas há oito anos, acordo as 4h30 da manhã. Tenho que manter meu emprego e minha condição física para apitar. Eu sou árbitro também do quadro profissional, mas não da pra gente se manter, por que? Porque a escala tem rodízio. Eu posso apitar um jogo ou não.
Corneteiro: Suas considerações finais, suas expectativas para 2011, que já começou com o título de melhor árbitro da Copa Itatiaia Brahma. Uma competição que formou árbitros como Márcio Resende de Freitas, por exemplo.
Adriano: Eu gostaria de agradecer a Rádio Itatiaia pela iniciativa que já dura 50 anos. Agradecer a vocês do corneteiro.com.br que cubriu esse evento de forma brilhante, de forma realmente muito séria. Deu espaço à arbitragem. Minha palavra sobre tudo é com o torcedor, que entenda que somos humanos, que acertamos, erramos. Que estamos fazendo nosso trabalho, pedir desculpas se por ventura houve falha da minha parte. Futebol é um espetáculo das oportunidades. Um dia um sorri, outro dia chora. É assim…
Gostaria de agradecer a Deus por ter me dado a oportunidade de estar ontem na final da Copa itatiaia. Me sinto uma pessoa realizada, desejo a todos um 2011 de muitas conquistas. Paz e felicidade à todos.
Muito obrigado pela a oportunidade.
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